13/12/2011

sapos verdes

confesso-me dividida entre dois mundos. é habitual, mas neste caso com a particularidade de ser algo que desde há muito me perturba ao ponto de ser minar relacionamentos pessoais e profissionais. falo de racismo.
eu sou dos açores e, que saiba, nos açores não há racismo, ou pelo menos não havia enquanto por lá andava. o racismo tem de vir de algum lado, de uma qualquer ideia pré-concebida em relação a alguém ou a um grupo em particular, de uma má experiência ou, frequentemente, de educação ou falta dela. nos açores vi o primeiro preto tinha eu uns 12 anos. foi pois com curiosidade que lhe perguntei se ele apanhava escaldões no verão. pois, eu sou desse tipo de tesourinhos deprimentes, é característica que levo comigo para outra encarnação. chineses? só muito mais tarde. ciganos? mais tarde ainda. não desenvolvi qualquer tipo de preconceito nem qualquer tipo de fascínio em particular, foram na maior parte das vezes gentes como tantas outras com quem me cruzei na vida ou no passeio. nada mais.
apesar disso sempre senti cá dentro uma qualquer dorzita ao menor comentário racista e de alguma forma sempre o tentei contradizer sem querer parecer reacionária –  espécie que me é muito pouco apelativa. não gosto, pronto. tenham paciência. fui vivendo bem com esta maneira de estar até há bem pouco tempo. mas agora nem por isso e partilho convosco as minhas incertezas.
desde que regressei a lisboa tenho sentido um crescente domínio dos racistas delicados. todos nós sabemos quem são. são normalmente aqueles que não sendo fundamentalistas, dizem que não são racistas e que até têm uma amiga ou empregada preta (mais ou menos como a cena de ter um amigo gay – sounds familiar hum?), mas que não perdem a oportunidade para um comentário qualquer jocoso acerca do colega que não compreendeu a tarefa «’táva-se mesmo a ver,  é preto (!)», right. esta atitude tenho visto amiúde nas minhas relações pessoais e profissionais e já me tem levado a sair abruptamente da sala (desculpem eu bebo muito chá e depois é uma chatice que tenho de ir 50x à casa de banho) ou, quando em ambiente mais pessoal, a confrontar o racista delicado até que ele fique sem argumentos e me mande pastar longe. ok, eu vou, mas vou com a razão.
mas o que me perturba por esses dias é o generalizado sentimento de antipatia e até algum ódio face aos ciganos. já os defendi, mas agora não sei o que faça, porque começo a sentir-me diferente face aos ciganos e temo que esse racismo me tenha contagiado. nunca tive grande contacto com grupos de ciganos e nunca tive razão de queixa dos mesmos, até há cerca de dois anos quando fui morar para a margem sul (vá, estremadura) e comecei a ver o efeito provocado pela passagem de comunidades ciganas. os pequenos furtos e fraudes, o medo que assomou aos locais, os cães e cavalos com costelas à mostra e feridas a gangrenar e o lixo. amigas, o lixo. não há coisa que me irrite mais que lixo no chão, deus se soubessem. não há habitante local que não tenha uma qualquer história para contar acerca de um mau cruzamento que já tenha tido com um cigano e a verdade é que até eu começo a ter algum receio, por exemplo, de ir correr em determinadas zonas onde sei que eles estão.
e é neste paradoxo que me encontro: entre a humanidade de sentir que somos só um, excepto os ciganos.

5 comentários:

  1. Aqui entre nós, que ninguém nos oiça, é uma comunidade muito complicada, mas acho que a principal culpa é nossa, e de termos passado da exclusão total dos antigamentes ao paternalismo mascarado de socialismo inclusivo dos últimos 30 anos. O cigano passou de praga a coitadinho, para os poderes. Para a população em geral, continuou a ser praga, mas já não se pode dizer.
    Aqui que ninguém nos ouve, quando mudei de casa cuidei em deixar uma distãncia entre mim e eles. Já morei perto de um bairro problemático, com ciganos e também pretos, e nem fazes ideia. O que vale é que andavam mais à bulha entre eles (não se pdoem ver, se há gente racista são os ciganos) que connosco, mas ó se era complicado.
    Os ciganos não se querem integrar, porque a cultura deles e blablá. E nós, o que fazemos? damos sem pedir nada em troca. Ou seja, finge-se inclusão, e depois não se exige nada por causa do respeito à diferença e ao multiculturalismo. Mas gamanço, contrafacção, absentismo escolar e lixarada não são traços culturais, temos pena. Eu sei que isto faria corar muito bloquista, mas com direitos vêm deveres, e a sociedade civil não tem de ter medo de o exigir. Ou então, levam corte nos subsídios. Tipo: cadastrado não leva nada, filhos faltam mais que x vezes corta rendimento mínimo e por aí fora. E isto não era só para ciganos, era para toda a gente: se querem apoio, não mordam a mão que alimenta e portem-se bem se faz favor. Quid pro quo.

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  2. Ai Izzie que deitaste tanta acha para esta fogueira e apoquentaste-me ainda mais!
    acho que tens toda a razão relativamente a essa doença do «paternalismo mascarado de socialismo inclusivo», toda! mas o que verdadeiramente me apoquenta é o facto de não raro tecermos comentários acerca da injustiça dos ciganos receberem subsídios e os putos não irem à escola etc e tal sem sequer termos dados concretos que nos levem a aferir isso. mas a ser verdade, Izzie, a ser verdade, vamos então discutir esse paternalismo exacerbado face a todo e qualquer coitadinho: o bêbado, o drogado, o abusado, o que produz e o que não produz, o branco e o amarelo. damos sempre com a condição de qualquer coisa, mas essa coisa não é fiscalizada decentemente. não sabemos se o bêbado tratou-se ou se anda na tasca desde as 6h da matina e não sabemos se o toxico'independente já arranjou trabalho e não anda por aí a gamar telemóveis e rádios de carros. e já agora, são branquinhos, buéda brancos.
    no fundo o que realças e concordo em absoluto, é que cultivamos esta política socialista do dar, mas não incutimos o dever cívico e a responsabilidade social que está associada a esta benesse e isto é transversal a qualquer raça ou credo.

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  3. Mas foi o que eu disse: é para toda a gente. Acabava a mama, ponto final. Não vou tão longe como alguns que advogam pô-los a fazer serviço cívico, mas quase. Até porque precisam de tempo para procurar trabalho (outro tópico: nenhum subsídio, salvo casos muito excepcionais, pode ultrapassar 2/3 do salário mínimo, boa?). Outra: obrigatoriedade de abertura de conta bancária para receber subsídios.
    Quanto aos ciganos em exclusivo, a única coisa que aponto é que são muito integrados para receber, e muito à parte e 'respeitem isso' para dar. Não pode ser. Sem bracinhos não há bolachinhas.

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  4. Eu até acho que a hipótese de pô-los a trabalhar pode ser bastante válida e com óvios benefícios para ambas as partes. Manter esta malta ocupada com um trabalho é bom para que mantenham o ritmo, conheçam a disciplina e ganhem experiência.
    quanto ao limite de 2/3 tenho dúvidas porque não sei ao certo em que é que isso se traduziria. em todo o caso eu acho que o problema não está na quantidade de subsídios ou mesmo no seu valor, mas sim nas condições em que os mesmos são concedidos e, em especial, como são mantidos.
    conta bancária, sure que sim, mas aí advogo o levantamento do sigilo bancário, senão de pouco serve. e de qualquer forma matamos logo 2 coelhitos de uma vez só porque a malta dos andares lá de cima também anda a brincar com o nosso dinheiro e dava jeito podermos cuscar as suas contas sem grande problema.
    quanto à integração dos ciganos, não se poderá dizer a mesma coisa dos chineses? raramente os vejo a conviver com tugas, a partilharem dos nossos interesses e cultura...

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  5. Os chineses têm um problema bem grave: as tríades, das quais muitos são escravos, e se calhar poderá vir daí alguma auto-exclusão. Mas acredita que não a vejo. Moro a um pulinho da nossa Chinatown (martim moniz) e olha que eles são muito ok. Na minha zona há imensos chineses, e para além de darem melhor vizinhança que os ciganos (lol), ao sábado vejo uma grande movimentação de crianças e adultos na escola primária: acho que há aulas de português. Aqui há uns dois anos também havia muitos ucranianos, russos e brasileiros lá na zona, mas agora ficaram praticamente só os brasileiros. Yep, moro na parte 'social' da cidade ;)
    E olha que em relação a ciganos, não querendo parecer o teu racista benevolente, não tenho preconceitos por aí além, e sou daquelas que manda bocas aos racistas de pacotilha. Mas tenho olhinhos, vejo o que se passa, e não embarco em multiculturalismos da treta e em socialismos de pacote. E estou farta que os ditos ciganos reajam com um 'aaaaai, racista de ciganooooos' sempre que alguém os chama à atenção. Comigo não resulta, não carrego culpas colonialistas ;) (e eles são tão maus para os pretos, credo, tão maus!)

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